quinta-feira, julho 22, 2010

Digo

É só um menino. Só um menino magro e baixo. Fechava os olhos sentado naquele banco do colégio ao lado da segunda árvore atrás das salas de aula sempre que ela passava. Abaixava a cabeça e falava bem baixinho o quanto amava aquela menininha.
A menininha era da terceira série. O menininho da quarta. Ela media 3 centímetros a mais que ele. Ele achava um absurdo. Ficava pendurado no galho do cajueiro, comia em pé, vivia de pé. Isso pra crescer logo. Só fazia doer o pé. Ela branca de cabelos castanhos. Ele moreno dos cabelos pretos. Ela vivia enrolando-os pelos dedos. Ele vivia enrolando a merendeira no casaco. É pra ninguem ver que eu uso merendeira, dizia. Ela usava um arco amarelo que combinava com as paredes do colégio. Ele amarrava cadarço do tênis no tornozelo.
Criou coragem e escreveu no espelhinho que ela usava. Escreveu com canetinha azul. "Voce é o amor da minha vida. Namora e depois casa comigo? Ass.: Digo". Nas regras do amor está tudo errado. Nos limites da razão está tudo errado. De longe a menininha sorriu faltando um dente. De perto ele viu que faltavam dois. Ele pensava que se ela tinha perdido os dentes de leite, era sinal de que estava ficando pronta pra namorar. Estava criando juizo, dizia ele.
Chovia demais. Tinham de andar por volta de cinquenta metros ate em casa. A dela era a vinte passos dali. O menininho se atrapalhava enfiando a merendeira numa mochila grande. A menininha deixou cair o guarda-chuva duas vezes antes de sair de debaixo da marquise. Nao conseguia atravessar um metro de extensao de uma correnteza de agua da chuva e sujeiras mais. Digo sorriu. Ja estava ao lado dela e sabia que pelo jeito que ela o olhou, havia aceitado namorar e se casar com ele. Entao, como bom homem, tirou o casaco e pôs na cabeça da menininha. Pegou-a todo esforçado no colo e encarou a agua, a rua e o frio. Ela sorriu com timida satisfaçao. Deu um beijo na bochecha bem molhado e correu com guarda-chuva torto os dez metros que faltavam ate a porta de casa.
A menininha de cabelos cacheados e bochechas vermelhas passou os outros quatro dias procurando o menininho moreninho que a olhava entre os dedos que escondiam a cara muito mal disfarçada.
Digo ria-se de bobo. Dizia estar no ceu. Mas a internaçao por leptospirose está longe de ser algo dos céus. A mae que nao se ria muito. Acabara por perder o ano. Teria que fazer a quarta serie denovo. Mas faria apaixonado.

4 comentários:

Mirela disse...

Aiii que lindo!!
Faz lembrar essa fase, mto bom.
Adorei mais uma vez!!

Beijosss

Gabrielle disse...

Sem duvida o primeiro amor é o melhor, é oq a gnt acredita q mais ama, e oq mais sofreu. É inocente e puro! Hj vou falar q além de gostar achei fofo! rs

Bia disse...

Adorei.
De verdade.
De verdade meesmo.

Achei simples, e liindo!

Leticia. disse...

Ia fazer apaixonado, e seria da mesma turma que ela =)
Muito bom!