segunda-feira, outubro 25, 2010

Puxa-me pela gravata

Tenha gravada na memória o dia que fui servo e não tirano. E vai tirando o pudor da sua boca. Desbocada é bem melhor. Mas só entre quatro paredes.
Das coisas que gosto é ter que sair a rua. Eu transpiro feito eles, animais. E, pior ainda, é ter que assim mesmo abraçar outros mais suados que eu. Eu pelo menos transpiro perfumado. Eles transpiram odor de fossa. Os meses de setembro e outubro são torturantes. Pedir voto é assim. E ainda dizem que é fácil. Ter que comer pastel, bolinho de batata, aipim, beber capirinha, cachacinha, isso tudo não é fácil. Não é fácil mentir, prometer, enrolar na resposta sobre promessas não cumpridas e me fazer como se fosse um deles.
Não sou das sacanagens nem das safadezas. Sou de palavra e de família. Uma palavra aqui, outra ali. Uma família aqui, outra ali. E o que que tem um caso aqui e outro ali? Deu no jornal que fiz sexo com a secretária no meu gabinete. Mas eu não tive culpa. Ela que pediu emprego pro namorado. Eu só falei que ofereceria uma oportunidade pro rapaz se ela puxasse a minha gravata. Ao jornal eu neguei. Afinal, foi na sala de reuniões e não no gabinete. Esses jornalistas...

terça-feira, outubro 19, 2010

Mulher de vinte e cinco

Só queria perguntar a idade. Apostava consigo que ela tinha vinte, no máximo. Foi ao encontro dela. Driblou dois, passou no meio da dança do terceiro e no quarto tropeçou bem de leve. Nada demais. Cutucou-a no ombro esquerdo, aproximou do ouvido pra que ela pudesse ouvir no meio do turbilhão. Antes disso lhes conto o início. Ele nunca saía pra boates. Só não gostava. Não bebia, fumava ou dançava. Era meio fofinho. Esquece, era acima do peso, gordo, referência pra quem vê e gigante pra quem abraça. Exagero, era um gordo quase magro, um esbelto quase obeso. Seu sorriso era um cartão de visitas, um samba-enredo com direito a nota dez. Por promessa, saiu com os amigos.
Foram para Juiz de Fora. Apenas três horas e meia de carro pela estrada. A contragosto entrou na boate. Bebeu uma caipirinha. Pensava que não poderia ser brasileiro sem ter provado ao menos uma caipirinha. O covarde virou corajoso, o tímido virou dançarino e o recatado virou conquistador. E voltamos, então, ao ouvido da menina.
Passaram-se algumas idas, algum desdém, algumas mexidas no cabelo, alguns olhares e algumas boas tiradas. Beijaram-se, trocaram MSN e sumiram. Acordou em casa, sozinho e com sensação de que tudo não passara de sonho. Mas não passara. Uma semana inteira de conversas pelo computador. O que era respondido com olhares e em, no mínimo 24 horas, é respondido já pela internet. O blog declara, o facebook divulga e encontra, o picasa mostra e o MSN permite. As conversas sobre a família, os medos quando criança, o prato preferido, a música que toca e o ex-namorados que passaram bem são coisas preenchidas pelo virtual. E nessa semana inteira conversaram e se apaixonaram assim mesmo pelas 18" daquela tela. É mais fácil ser verdadeiro por ali.
Dessa vez pegou um ônibus na sexta-feira a noite. Chegando em Juiz de Fora ela o recebera naquela rodoviária pequena e fria. O abraço e beijo mais quentes. Tiveram a primeira noite. Nada de errado. A semana inteira de conversa pela internet preenchia o espaço equivalente aos meses que os casais se conheciam. Os e-mails diários confidenciavam os sonhos. Uma distancia facilmente derretida. Um chocolate em cima do corpo, como molde de um sorvete a ser mordido.
Ele escondeu-se atrás da porta do quarto. Chegou sem avisar. Telefonou para o celular dela assim que percebeu que ela havia entrado na casa. Pediu pra que fosse ao quarto. Quando ela entrou a imagem dele em tempo real era transmitida para um monitor de 40" enfeitado com corações. Na tela ele a pedia em casamento. Pediu pra que ela se virasse para que o beijo fosse de verdade. Nada mais perfeito que um pedido virtual e um desejo real. Os cantinhos não são tão mais frios e distantes. Permaneceram conectados com esse péssimo trocadilho vivendo, como diria Cazuza, o bom do amor seja de mãos dadas ou clicando por aí. Ah, e ele perdeu a aposta. Ela tinha vinte e cinco anos. Mas nem parecia.

quarta-feira, outubro 06, 2010

Pior um carinho na mão que dois voando

O carinho vem sempre de quem não se espera tanto. Se quer encostar no cantinho verde de tinta, a mesma está pra lá de passada e nem faz sombra. Encosta no verde que vira amarelo. Poe a pontinha do dedo no azul que fica rosa. Nem viva esperando que preencham seus balões daqueles desenhos de colorir da época de escola porque vão rabiscar, despentear, amarrotar mas nunca, sinceramente, será colorido como você deseja. Não há o que se fazer para o descolorir. Aconselho que tu sejas homem de recusar carinho de quem não deseja. Não existe a máxima de que um carinho na mão é melhor que dois voando. Deixe os dois voando. Primeiro porque a fidelidade ao que se sente é uma dignidade dos grandes heróis. Também pudera, aceite carinho de quem não é o seu sonho e durmirá mal por tanto tempo que seja. Se não o carinho de quem se quer, nada feito.