Não é, digamos, daquele tipo de fazer planilhas até para a
vida sexual dos animais de estimação. Só que nesse dia resolveu colocar em
números o tempo perdido por não ter dado o braço a torcer. Pela primeira vez fez
as contas de cabeça mesmo.
Reginaldo tem 52 anos. Sabe que demorará para aposentar.
Desses anos tem lembranças a partir do sétimo ano de idade. Põe aí 45 anos de
alguma lucidez. Perdeu a foto mais comentada pela família na infância por ter
ficado de bico após a mãe recusar a deixar comer brigadeiro antes da hora. Não
deu o braço a torcer. Perdeu algumas horas de festa. Perdeu alguns dias,
somando as datas especiais de reuniões em família em que comentam sobre a foto.
Com a esposa perde, por vez, noites de amor e sexo quando demora a dar o braço
a torcer. Somando esse fato corriqueiro desde que começaram a namorar lá pela
época de seus 21 anos, caramba, são alguns anos perdidos.
Isso, salvos alguns erros de percurso, pode ser chamado de
orgulho. Há, pelo menos, um Reginaldo lendo. Ou um Reginaldo amigo de quem está
lendo, ao lado ou ao longe de quem está passando os olhos por essa crônica. Uma
pessoa orgulhosa carrega essa fama por onde vai. Variam em tipos e formatos.
Conheço o orgulhoso mais disfarçado do mundo: aquela pessoa humilde e amável em
quase todas as esferas da vida mas que não sabe, em hipótese alguma, pedir
desculpas. Talvez seja por alguma sensação de que pedir desculpas é sentir-se
inferior. É um tipo, mesmo travestindo sorrisos de quem pode ter acabado de
realizar a missão mais linda do mundo, que procura e acaba encontrando mesmo
num erro grande um motivo para se isentar da obrigação de se retratar.
Não há aqui a vilanização do orgulho. Existe uma coloração
do orgulho extremamente necessária. É o chamado amor-próprio. Na outra ponta
vira arrogância. Mas por qual motivos andamos preferindo tanto a arrogância?
Ninguém recua. Cada vez menos nos apresentamos dispostos ao diálogo. No
primeiro incômodo fechamos a cara, saímos do grupo do Whatsapp, ficamos por
dias – ou anos em alguns casos – sem falar por puro orgulho. Perdemos uma boa
viagem, um bom jantar, uma boa gargalhada com o amigo desastrado, uma
confidência da tia agradável, o momento que a tão disputada coxa do peru de
natal acaba caindo ao chão, a vergonha de uma dança ridícula, uma noite ou
tarde de sexo gostoso. Tudo por orgulho.
Reginaldo acabou de dar o braço a torcer. Nem doeu. E se tivesse
doído seria por bem menos tempo e intensidade que ficar dias dentro de uma
armadura. É ou não é muito engraçado quando a criança está de bico e tenta, com
delicioso insucesso, não rir de algo hilário? Numa conta simples você percebe
que o tempo perdido com a cara fechada é imenso. A sorte é que Reginaldo é
apenas uma personagem fictício e eu, como escritor, posso facilmente
reescrevê-lo substituindo esse orgulho por amor-próprio. Reescreva também.
Thiago Kuerques
Um comentário:
uu291 guess srbija torbe,puma future,hugo boss donna,cotopaxi allpa canada,buty diesel skórzane,blundstone boots,cotopaxi backpack,jack wolfskin skor,cotopaxi ropa montaña ss754
Postar um comentário