segunda-feira, março 15, 2010

Ao sair do quarto

Virei pro lado e traguei o que seria o último perfume saboroso da pequena. Levantou com aquele vestido dos céus, uma divindade da beleza, uma roupa de dormir sensualmente elegante com corações vermelhos e predominância branca. O tal vestido começava com duas finas alças, abraçava um decote que tentava sem sucesso algum ser singelo e percorria até a metade das coxas num tecido liso, escorregadio, excitante. Ela esteve numa das melhores noites. E nunca esteve tão distante. Por isso a noite foi distinta. Os homens olham e sentem muito o corpo e um pouco a alma. As mulheres sentem um pouco mais a alma que o corpo. Ambos sentem. Eu senti um branco absurdo nos olhos dela. Pelo que me recordo passava alguma coisa na TV que eu nem sei, uma briga de ogros divergentes sobre futebol no bar lá debaixo, uns uivos do Cazé, meu papagaio de tufos amarelos, e uns arrastões de móveis no apartamento do vizinho de cima. E ela tocou o celular, interfone, capainha, meus peitos, meu dito cujo, minhas coxas, minha língua, minhas covas da virilha, minha cama, e, por fim, tocou com o lado de fora da mão a maça do meu rosto.
Conheci muitas coisas que disseram um bom oi. Aquele sorriso diferente no meio de um monte de gente. A primeira vez que a amiga mais descarada ficou ruborizada de vergonha. Quando me pediram telefone, quando ofereceram o ombro, quando ofereceram uma noite longe, quando simplesmente optaram pelo fio vermelho. Tem certos momentos que descobrimos como boas entradas em nossas vidas. E existem momentos de despedidas tão singelos quanto. Uma quantidade de chamadas não atendidas no telefone, um não convite para um evento especial, o sumiço em si ou a indiferença entre o bom dia e o boa tarde. O branco vazio esfumaçado dos olhos dela ao sair arrumada do banheiro, cançando as sandálias verde-ouro, e, assim mesmo sem qualquer espécie de adeus, sair escorregadia pela porta marrom, envernizada e eterna da saudade. Saudade da minha alma, do meu coração. Pois, lhes digo, ao sair apague a luz, feche a porta e diga tchau porque, pra quem fica, há sempre uma esperança de que ninguém se foi de vez.

4 comentários:

Caroline disse...

Eu adoro os seus textos!

tabinhahh disse...

Adorei!!...
beijos

H L disse...

para quem fica sempre existe a esperança de quem ninguém partiu de vez...
e essa sensação é tão incomoda, triste...traz junto um nó na garganta!


liiiiindo texto

Unknown disse...

Você lê Sidney Sheldon??
Sinto uma leve inspiração...