terça-feira, abril 14, 2009

Pintando uma espera

Quando decidiu ser pintor começou comprando telas límpidas com madeira de uma daquelas campanhas eco-responsáveis. Comprou um caderninho médio e começou a anotar os nomes que deveria ser fã. O primeiro da lista foi Salvador Dalí. Arrumou um modo de comprar pincéis de todos os tipos a preços um pouco menores. Ajeitou todo o quarto vendendo uma cama, comprando um tripé dos bons colocando-o no canto do quarto. Arrumou uma malinha onde pusera as novas capsulazinhas de tinta e os pincéis intocados. Certificou-se que dispusera de tudo que Portinari havia falado ser da personalidade de um pintor: o gosto pela arte, o olhar minucioso, os surtos de criatividade e solidão, a desapego ao que irão achar do que se faz e o medo de copiar e ser copiado. Sabia que era assim e mais um pouco. Conseguiu ir a uma exposição de Da Vinci, outra de Rembrandt e passou a fazer piada com Van Gogh. Conheceu pintores velhos e novos e velhos novos desconhecidos. Teve aulas com Dario Silva em Nova Iguaçu. Criou em si as próprias expectativas em silêncio. Batizou esponjas de amigas. Observava revistas em quadrinhos. Mas nunca havia pintado uma figura sequer. Preparava o terreno para o primeiro quadro.
A cerca de vinte minutos atrás meu irmão telefonou avisando que era dia de pintar. Conheci sua primeira obra depois de dez anos de preparação. E mandou avisar que não era a última tela. E gastou um pouco mais de trezentos reais nessa espera.

4 comentários:

carolbardi@hotmail.com disse...

Ah, o que dizer? É bom demais para as minhas palavras virarem comentário a altura. Só sei dizer que te amo. E você escreve muito melhor do que posso explicar. Meu orgulho!

Melissa disse...

Thiago, engraçado como estamos sempre esperando o momento certo, e assim as horas vão passando, passando...
Em 10 anos muita coisa já poderia ter sido feita... E talvez o melhor seja ver a evolução do trabalho, o progresso feito!
Beijos, bom te ver lá no blog novamente!
:)

Anônimo disse...

Há uma preparação necessária para se expressar, mas talvez ela se faça mais por erros e acertos, guardando resultados em segredo, do que numa espera. Mesmo assim, ficou muito belo o texto.

Um abraço,
Vitor

Anônimo disse...

Essa sim é arte dominada por poucos, a espera.