quinta-feira, agosto 05, 2010

Digo - Fim

Dormia sem perceber. A criança só conseguia acordá-lo quando acertava o meninao em cheio. Eram dois, tres gritos dele. Eram mais de dez minutos de choro desesperado da criança. E era mais uma noite desaforada em que a esposa o pusera pro sofá. E no sofá eram cinco contas atrasadas, tres empregos, a falta de mulher, de férias e o escesso de gordura. E um pesadelo. Quando acordava via na filha a menininha do dia da chuva. Olhava pra esposa e via a mulher dos dias de sol. Abraçava as duas. Fazia sol e chuva. Era um casamento sem viuva. E fazia arco-iris.
Foi levar a criança ao colégio. Era uma das viagens de onibus pra algum sitio desses. Voltariam no domingo. Deixou a menina e sentou-se num banco. As paredes maltratadas. Deviam cuidar mais. As salas tão mais miudas. Deviam lavar menos. As mãos cobriam o rosto e cheiravam diferente. E entre os dedos ninguém. Era dia chuvoso. Mas era chuva fraca. Riu de si com satisfação de criança com doce em mãos.
Ultrapassou sinais vermelhos, cantou Dominó e quis merendar antes de chegar em casa. Mais uns vinte minutos e já estava em frente ao espelho do banheiro do quarto.
A menininha, esposa, chegou em casa toda atrapalhada com o guarda-chuva. E entrou assim mesmo no quarto. Ele saiu do quarto dando um boa noite e um selinho nela. Pisou na sala e voltou para o quarto. As mulheres não demoram mais que três minutos para se verem em algum espelho. Entrou sorrateiro no banheiro e ela chorava.
"Voce é o amor da minha vida. Namora e casa comigo? Ass.: Digo".

Gargalharam lembrando disso.
- Ja fazem apenas 76 anos daquele dia chuvoso na quarta série.
- Fazem? Não, meu velho. Fazem 74 anos. Voce erra sempre por dois.
- Nao, fazem 76 anos. Você lembra da...

É, meu velho. É o amor. Na chuva, na infância...

2 comentários:

Ira Buscacio disse...

Menino!!!!!! Lindo.

Continue...escreva, escreva

Bj

Gabrielle disse...

Adorei o desfecho! =)