quinta-feira, dezembro 09, 2010

Os médicos também choram

Diziam que ele teria uma filha. Ele queria dois meninos. E os queria espertos e rubro-negros. Que gostassem de praia e da noite e de carros e de sinuca. Brincava. Sabia que teria uma menina. Nos registros do destino constava no parágrafo décimo nono que ele teria uma filha e choraria por dois motivos e ao mesmo tempo.
Elias conheceu Roberto num churrasco com os amigos. Roberto conhecia Catarina que conhecia Amanda que era irmã de Josias que era companheiro de trabalho de Linda. Em uma festa de reveillon Elias convidou Roberto que já namorava Catarina que, por sua vez, chamou os irmãos e os amigos. Na terceira queima de fogos Linda já brindava com Elias. Perde a graça se eu apenas citar como tudo foi? Poderia dizer que trocaram telefones, encontraram-se em outras duas oportunidades em festas com amigos, em uma semana estavam com os lábios grudados numa sala de cinema, em dois meses planejavam o próximo ano e em quatro meses planejavam a lua de mel. Mas eu direi que em oito meses moravam juntos. Ele de Áries e ela de Mesquita. Sonhavam com o Rock In Rio e com uma casa de praia. Contentaram-se com um conjugado na Glória. Pelo menos por enquanto. O conjugado era pequeno e o amor era enorme.
Ao receber a notícia Elias chorou. E quando terminou a notícia Elias chorou mais. Passaram-se sete meses do dia que ele quebrou a mesa muito sem querer pra comemorar a gravidez da esposa. Linda ficava cada vez mais bonita. Combinavam que o nome seria Arthur se menino ou Elizabeth se menina. Meu caros leitores, deveria ser menina. Deveria ser.
Linda perguntou ao médico se Elias estava calmo. Perguntou se eles dariam bons pais. O médico respondeu que sim, apreensivo. A pressão arterial aumentou assustadoramente. Houve convulsão. O cirurgião fez teste com a urina dela. Foi notada a presença de proteína na urina. A maioria dos médicos não choram. Este chorou. Enfermeiros choraram. O nome é eclampsia. Linda, em coma, sobreviveria se Elizabeth morresse. Era dezembro, dia 29. O Rio de Janeiro não lembrava nem de longe a alcunha de cidade maravilhosa. Perguntavam nas comunidades da internet onde estava o sol. Nem a maré na praia do leme começou a subir lás pras dezoito horas. Os pescadores achavam o dia meio estranho. Os taxistas, gaiatos, pareciam calados demais. Nem parecia verão. Anunciava um temporal. E continuava o 29 de dezembro. Elias tinha apenas 19 anos.
Pediu por sol, pediu por fogos no Reveillon e no amanhecer do novo ano pediu por ela. Pediu pela vida gritando de frente pro mar de copacabana, com lágrimas escorrendo até o queixo. Pediu um sinal. Uma folha seca em forma de coração bateu com o vento no peito de Elias. Consultou os mesmos registros do destino e começou a acreditar em anjos.

Um comentário:

Roberta disse...

Que triste ='/
Vai ter continuação? Quero saber o que aconteceu!